
Percepção de falta de respeito dos alunos, salários
insuficientes e uma carreira pouco segura para os jovens. É assim que a maioria
da população brasileira enxerga a profissão docente e coloca o País como o que
dá menos prestígio aos professores.
Esse cenário foi revelado pelo Índice Global de Status de Professores de 2018,
divulgado na noite desta quarta-feira, 7, pela Varkey Foundation, organização
voltada para a educação. O levantamento avalia como a população de 35 países
enxerga a profissão.
Enquanto há uma tendência global de crescimento no prestígio
dado aos professores, o Brasil regrediu nos últimos cinco anos. Em 2013, quando
o estudo foi feita pela primeira vez e avaliou 21 nações, o País aparecia na
penúltima colocação. Na edição deste ano, com a piora na percepção sobre o
respeito dos alunos e com menos pais dispostos a incentivar seus filhos a
seguir a profissão, o índice nacional piorou e colocou o País como lanterna do
ranking.
Para chegar ao indicador, foram entrevistadas mil pessoas,
de 16 a 64 anos, em cada país e mais de 5,5 mil docentes. No Brasil, apenas 9%
acreditam que os alunos respeitam seus professores – na China,
o líder, 81% veem esse respeito. O dado aparece em consonância com o fato de
que só 20% dos pais brasileiros afirmam que encorajariam seus filhos a seguir a
carreira – ante 55% dos pais chineses.
O estudo também indica que o brasileiro subestima a jornada
de trabalho da profissão. A sociedade estima uma carga horária semanal média de
39 horas, ante o relato dos professores de uma média de 48 horas. Segundo a
pesquisa, essa percepção é forte nos países latino-americanos e se diferencia
de países como Finlândia, Canadá e Japão,
onde os docentes trabalham menos horas do que a percepção de suas
comunidades.
A mesma tendência é observada em relação aos salários.
Enquanto brasileiros consideram que um salário justo para os professores seria
de U$ 25 mil (cerca de R$ 93 mil) ao ano, a remuneração real média relatada
pelos profissionais é de U$ 15 mil (cerca de R$ 56 mil).
Professor de Geografia, Heleno de Oliveira, de 52 anos, diz
ter sentido a desvalorização da profissão nos 35 anos em que atua em sala de
aula. “Cada vez são mais comuns os relatos de colegas que foram agredidos ou
xingados por alunos, que precisam ter mais de um emprego para se sustentar ou
que adoecem por causa da pressão”, diz o docente, que dá aula em escolas da
rede pública de São Paulo.
Ele diz ter descoberto a vocação aos 17 anos, como
estagiário. Ver os alunos aprendendo e interessados p é o que motiva Oliveira a
continuar em sala. “Já pensei algumas vezes em desistir porque saio às 22 horas
da escola, preparo minhas aulas até as 2 horas da manhã. E o salário é muito
pequeno diante de tanto esforço. O que me segura é a relação com alguns alunos,
perceber que posso fazer a diferença na vida de alguns”, diz.
Luiz Antonio, professor de Língua Portuguesa em duas escolas
privadas do centro de São Paulo, diz que sente desrespeito maior dos pais do
que dos jovens. “Tem uma interferência muito grande da família, que tira a
nossa autonomia. Não gostam quando chamamos atenção do filho, questionam o
conteúdo. Não entendem que estudamos e temos formação para ensinar não só a
disciplina, mas como conviver dentro da escola”, diz ele, de 44 anos – 20 em sala
de aula.
Para especialistas, a repercussão de projetos como o Escola
sem Partido, que defende vetar a “doutrinação ideológica” em classe, pode
agravar ainda mais tensão no ambiente escolar.
Desempenho
O estudo também identificou que a valorização docente está
ligada ao desempenho dos alunos. Países com melhores notas no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), maior
avaliação de estudantes do mundo.
“Mais respeito aos professores significa que estudantes com
melhor desempenho serão atraídos para a profissão, que melhores docentes irão
permanecer na carreira. São fatores muito importantes para melhorar os
resultados educacionais dos países”, explicou ao Estado Vikas Pota, presidente
da Varkey Foundation.
Para ele, o poder público precisa investir em ações para
apoiar os professores, tanto financeiramente como na melhora de condições de
trabalho, para que os índices educacionais do país progridam. Na última edição
do Pisa, em 2016, o Brasil apareceu entre os dez últimos do ranking. De 70
nações avaliadas, o País ficou na posição 63.ª em Ciências, 65.ª em Matemática
e 59.ª em Leitura.
3 Perguntas para Silvia Colello, professora da
Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP)
A baixa remuneração é um dos principais fatores para a
desvalorização da carreira docente?
Os baixos salários são, ao mesmo tempo, causa e consequência.
As pessoas desvalorizam o professor porque ele ganha pouco e ele ganha pouco
porque não é valorizado nas políticas públicas. Além disso, os políticos sempre
falam genericamente sobre a valorização do docente. Nunca se desenvolve a ideia
de que é preciso melhorar a questão salarial, a evolução da carreira, as
condições de trabalho e o apoio que ele deve receber da equipe escolar e das
famílias.
Os pais também desvalorizam o professor?
Na maioria dos casos, o professor não conta com o apoio da
família porque muitas não querem se envolver com o que acontece na escola.
Então, não querem saber do mal comportamento ou do baixo desempenho do filho.
Preferem culpar o professor por essas situações. Propostas que estão sendo
colocadas nesse momento, como o Escola Sem Partido (em tramitação no Congresso
Nacional e defendido pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, do PSL), tendem a
acirrar essa relação por colocar pais e professores em lados opostos, por
incentivar que o docente seja vigiado, controlado, perca a autonomia sobre o
quê e como ensinar.
O País está perdendo bons professores pela forma como os
trata?
Sim. Os jovens com melhor desempenho vão para as profissões
mais valorizadas, com melhores salários. Os cursos de Licenciatura e Pedagogia
são vistos como o “que sobrou”, porque ninguém quer seguir a carreira. Cada vez
menos temos fatores de recompensa. A médio e longo prazo, isso é um desastre
para a educação do Brasil.
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