Opinião: Juventude; Possibilidades e Limites na Contemporaneidade - Jornal Diário do Curimataú
Opinião: Juventude; Possibilidades e Limites na Contemporaneidade

Opinião: Juventude; Possibilidades e Limites na Contemporaneidade

COMPARTILHE
Ronaldo Rodrigues -

A juventude tem-se constituído objeto de inúmeros estudos de diferentes perspectivas. Abordagens sociológicas, psicológicas, pedagógicas, antropológicas, analisam mudanças físicas, psicológicas e comportamentais que ocorrem nesse momento da vida. Muitos estudos sociológicos voltam-se para problemas comuns da juventude, como abuso de álcool e drogas, delinqüência, gravidez, vida escolar, entre outros. Ou seja, circulam ideias no cotidiano que associam a juventude à noção de crise, irresponsabilidade e problema social e que carecem de políticas públicas. No entanto, abordar a juventude, na normalidade do seu cotidiano é tarefa importante, caso se queira empreender uma reflexão sobre a sociedade atual.
Outro aspecto a considerar é a ideia de ter uma idade ou pertencer a uma idade. Lloret (1998) diz que os anos nos têm e nos fazem crianças, jovens, adultos ou velhos, e pertencer a um grupo de idade significa ter que se adequar a um conjunto de coisas que podemos ou não fazer. E a vida passa a ser graduada a partir da idade: idade escolar, idade do trabalho, idade militar, idade da rebeldia... Evidentemente, a idade adulta é proposta como a meta a ser alcançada, como diz Lloret:

A postura ereta e a maior estatura do homem adulto configuram a imagem do modelo a alcançar em uma etapa ou ápice de máxima potência; precede-a outra que indica um presente reduzido, porém numa direção de crescimento; segue-lhe a figura declinante do velho que parece anunciar o ocaso (Lloret, 1998:18).
A idade não é, então, somente um conjunto de anos que se vai agregando num processo linear, mas determina expectativas e comportamentos, podendo tornar o tempo um inimigo. Por outro lado, diz Lloret (1998:20) que, no devir das experiências e respostas existenciais, uma idade não elimina a outra, mas a contém. Em vez de se pensar na juventude como um momento de preparação para algo que está por vir, alimentando preconceitos e hierarquizações, acreditar que «o menino e a menina, o jovem e a jovem estão na pessoa adulta ou velha e, inclusive, os meninos e as meninas podem responder como adultos em determinadas situações».
Mas de quem se fala quando se usa o termo juventude? O termo aparece ao longo da história, mas seu conteúdo ganhou sentidos diferentes. Como salienta Levi e Schmitt:
De um contexto a outro, de uma época a outra, os jovens desenvolvem outras funções e logram seu estatuto definidor de fontes diferentes: da cidade ou do campo, do castelo feudal ou da fábrica do século XIX... Tampouco se pode imaginar que a condição juvenil permaneça a mesma em sociedades caracterizadas por modelos demográficos totalmente diferentes (Levi e Schmitt, 1996:17).

As Nações Unidas entendem os jovens como indivíduos com idade entre 15 e 24 anos. Mas o critério da idade não é suficiente para discutir uma categoria que assumiu contornos tão diferentes. Nem se pode percebê-la como grupo social homogêneo, pois se agrupam sujeitos que só têm em comum a idade. É preciso distinguir a fase da vida e os sujeitos, ou seja, não se pode misturar juventude e os jovens; o primeiro é a fase, e o segundo são os sujeitos que vivem uma diversidade. Qualquer reflexão supõe pensar a tensão entre a inserção na estrutura social e a fase da vida.
Sposito (1997), reconhecendo que a própria definição da categoria juventude encerra um problema sociológico passível de investigação, aponta que o modo como se dá a passagem —heteronomia da criança para a autonomia do adulto—, a duração e as características têm variado nos processos e formas de abordagem dos trabalhos que tradicionalmente se dedicam ao tema. Também, porque a estruturação das idades difere enormemente de uma sociedade a outra. Ariès (1981) fala que, no período pré-industrial, não existia a adolescência como é entendida hoje, e a infância não estava separada do mundo adulto. Aos sete/oito anos de idade, mandavam-se os filhos para a casa de outros como aprendiz. O sistema escolar não era de grande abrangência e não se tinha uma homogeneização institucional das classes de idade. Então, a categoria jovem poderia abranger indivíduos dos 6 aos 40 anos de idade.

Para Ariès (1981), são os humanistas e religiosos que proliferam, a partir do século xv, teorias e práticas que distinguem a infância da juventude e da vida adulta. Concomitantemente a isso, o crescimento do ensino que separa as crianças e jovens dos adultos. Emílio, de Rousseau, é a obra que vai produzir, em nível teórico, a concepção moderna de infância e adolescência —matriz do que será depois juventude—. A adolescência será definida por Rousseau como um segundo nascimento. Uma época, segundo ele, especialmente turbulenta, que deve ser constantemente vigiada. Essa concepção consolida-se no século XIX e, junto a ela, um interesse novo pela juventude, tempo também de turbulência, caracterizada por um excesso de paixão irracional que deveria ser vigiado e enclausurado.
Perceber a juventude como um momento da vida que marcaria a saída da infância até o ingresso no mundo adulto, vivido de forma homogênea, é ignorar as condições histórico-culturais dos integrantes desta categoria. Como anuncia Levi e Schmitt:
Essa «época da vida» não pode ser definida com clareza por quantificações demográficas, nem por definições de tipo jurídica, e é por isso que nos parece substancialmente inútil tentar identificar e estabelecer, como fizeram outros, limites muito nítidos (Levi e Schmitt, 1996:19).

Segundo Pais (1993), a juventude é uma categoria socialmente construída. Portanto, sujeita a modificar-se ao longo do tempo. A segmentarização do curso da vida em sucessivas fases é produto de um complexo processo de construção social. No dia-a-dia, os indivíduos tomam consciência de determinadas características e, se elas afetam um universo considerável de indivíduos pertencentes a uma geração, são culturalmente incorporadas. Se essas características de um período da vida apresentam-se como expressão de problemas, então atraem a atenção dos poderes públicos, tornando-se objeto de medidas legislativas ou não. Como exemplo, há os programas de formação profissional, prolongamento da escolaridade, a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente e muitas outras.
A idade, como critério para agrupar as pessoas, traz implícito o caráter da transitoriedade. Nesse caso, a juventude representaria uma transição, e ser jovem seria estar numa condição provisória. Como diz Melucci (1997), esse modo de ver a juventude como mera transição decorre de uma compreensão da vida adulta como estável em oposição à instabilidade juvenil, fato que não se sustenta hoje, pois a sociedade contemporânea é marcada pela incerteza, mobilidade, transitoriedade e abertura para a mudança. Os atributos tradicionais da juventude parecem ter se deslocado para além dos limites biológicos. Tematizando essa questão, Melucci escreve:
La juventud no es una condición enteramente biológica, sino que también es cultural. Los individuos no son jóvenes porque (o sólo porque) tengan una cierta edad, sino porque siguen unos ciertos estilos de consumo o ciertos códigos de comportamiento y vestimenta. Ahora, la adolescencia se prolonga mucho más allá de sus fronteras biológicas, y las obligaciones para con la vida adulta se posponen hasta después de los veinticinco e incluso de los treinta años (Melucci, 2001:138).
As razões apontadas pelo autor demonstram a dificuldade de responder questões relacionadas à identidade, pois as referências da sociedade tradicional, os momentos de trânsito —os ritos de passagem— não se configuram mais como possibilidade para qualquer definição de juventude. Num contexto cultural marcado por diferentes pertencimentos, interações planetárias, explosão de oportunidades para a experiência individual, as fronteiras entre juventude e maturidade, segundo Melucci, evaporaram-se.
Autores que trabalham com a temática da juventude, entre eles, José Machado Pais, Melucci, Peralva, Abramo, Dayrell, Carrano, Sposito, entre outros, trazem um novo significado para os estudos sobre a juventude, colocando o jovem como protagonista de um tempo de possibilidades. De promessa de futuro ao modelo cultural do presente.
Rompendo com a ideia de grupo homogêneo com características comuns a uma idade, é que esses autores falam em juventudes, buscando construir uma noção de juventude pela ótica da diversidade, pois o lugar e o trabalho não definem mais a identidade dos indivíduos. Muitos são os modos de ser jovem. Pais (1993) propõe o exercício de olhar a juventude em torno de dois eixos semânticos: como aparente unidade e como diversidade.

Ronaldo Rodrigues

ACD. em pedagogia pela UFCG, Campus Cajazeiras, Educador Social e em Diabetes, Assessor de Mídias e Publicidades, Colunista e Blogueiro.